terça-feira, 23 de março de 2010

No gabinete do físico Alexandre Volta
No laboratório onde trabalhava Alexandre Volta, a desordem reinava. Objectos e materiais
diversos - cobre, vidro, garrafas e pequenos vasos cheios, vazios, abertos, fechados, discos de
metal, de pele - tinham-se acumulado e o local estava de tal forma cheio que ele já não se
conseguia mexer. Tinha mesmo proibido a entrada aos empregados : a ideia de que alguém
pudesse mudar de lugar algum dos seus instrumentos ou papel apavorava-o. Só ele sabia onde
encontrar as " coisas " naquela desordem. Os outros eram incapazes de adivinhar o que
arrumar e como o fazer. Sem contar que,naquela confusão, ele guardava também as notas que
serviam para escrever os relatórios das suas pesquisas.
Alexandre lembrava-se justamente da carta escrita a Priestley, onde descrevia uma das suas
descobertas, formulando este desejo: "Agrade-lhe ou não, gostaria de dar um nome ao meu
pequeno aparelho, que seria o electróforo perpétuo." O electróforo ... Já tinha passado tanto
tempo ! Sobrecarregado por outras curiosidades, tinha negligenciado este pequeno
instrumento promissor. Tinha-se tornado tudo tão complicado - sobretudo desde que Galvani
também começou a trabalhar sobre a electricidade. Era um homem realmente estranho este
Galvani, com os seus sapos... Que polémica se tinha seguido! No entanto, Volta tinha a
certeza das suas ideias! Perdido nos seus pensamentos, foi novamente controlar o electróforo :
levantou a tampa de madeira (o electróforo propriamente dito) da base de resina. Ao tocá-lo,
verificou que o aparelho ainda fornecia electricidade negativa. Se calhar não poderíamos
dizer que era realmente "perpétuo", mas funcionava, ainda assim, durante um algum tempo!
Controlou as suas notas : a experiência tinha começado três dias antes. Tudo corria bem.
Sim, muitas outras coisas tinham ocupado o seu pensamento depois desta descoberta, tinha
ocupado a sua primeira cátedra : a cátedra de física do liceu Côme. Tinha viajado bastante:
Suiça, Alemanha, Holanda, Inglaterra, França. Tinha-se encontrado e colaborado com pessoas
apaixonantes : Lavoisier, Laplace... guardava uma recordação de cada um deles. Hoje, tinha
também previsto guardar as notas sobre o seu " aparelho electromotor ".
Meu Deus, como este aparelho, formado por discos de dois materiais diferentes empilhados
uns sobre os outros, lhe tinha dado que fazer ! De certeza que se divertiu a cortar os bocados
com as mesmas dimensões para facilitar o empilhamento ! Até o próprio recipiente tinha sido
difícil de construir... Agora, que estava satisfeito com o resultado, ainda lhe faltava descrever
o instrumento para preparar a comunicação que devia fazer na Royal Society, a sociedade dos
cientistas de Londres que validava as descobertas e as invenções.
"Trata-se apenas de um conjunto de bons condutores de espécies diferentes, dispostos de uma
forma particular. Trinta, quarenta, sessenta bocados., ou mais, de cobre, ou melhor de prata,
aplicados cada um sobre um bocado de estanho, ou melhor ainda, de zinco, e um número
igual de camadas de água pura, ou de qualquer outro líquido que seja um condutor melhor
que a água simples, como a água salgada, detergente, etc., ou bocados de cartão, de pele, etc.,
bem embebidos destes líquidos. Camadas destas colocadas entre cada par ou combinação de
dois metais diferentes, uma série alternada e sempre na mesma ordem destes três condutores,
eis tudo o que constitui o meu novo instrumento."
De repente levantou os olhos da folha - o que é que lhe veio à ideia agora? Pensava naquele
dia, há muito tempo atrás, no lago Majeur, quando, da sua barca, viu subir do fundo do lago
uma quantidade de pequenas bolhas. Que fez nesse momento ? Remexeu o fundo com um
pau : outras pequenas bolhas de gás apareceram à superfície e recolheu-as. Graças às
experiências que fez no seu local de trabalho, apercebeu-se que o gás recolhido era
inflamável. E se utilizasse a faísca eléctrica para o fazer explodir ? Era um fenómeno a
estudar, podia-se se calhar tirar alguma coisa... Empurrando os papéis mais próximos, fez cair
os que estavam mais afastados da mesa e apanhou-os resmungando : " Escreverei mais tarde
a comunicação para a Royal Society. Neste momento, parece valer a pena reflectir sobre esta
ideia. " Pegou numa nova folha de papel, aproximou o tinteiro e começou a desenhar : devia
imaginar como fazer explodir o gás que tinha visto subir do fundo do lago. Precisava de um
contentor fechado para que o gás não escapasse, o gás que precisa seguidamente fazer
explodir no interior. Parecia ser um bom problema a resolver.
Mergulhado nas suas reflexões, não ouviu bater à porta: a sua mulher apareceu à porta do
gabinete, estava na hora da refeição. Mas quando viu o seu marido ocupado a escrever,
cercado de pilhas de folhas e de livros, afastou-se abanando a cabeça. Não valia a pena
incomodá-lo, estava demasiado ocupado com a sua pesquisa e o seu trabalho. Nessa noite
comeriam juntos.
Leopoldo Benacchio et Angela Turricchia

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